Caixa investe em gestão para deixar de ser fonte de escândalos. Conseguirá?


Banco público se esforça para cortar gastos e melhorar eficiência. Lucro líquido passou de R$ 4,1 bilhões para R$ 12,5 bilhões em 2017. Mas não consegue escapar das garras dos políticos (Flávia Pierry)

Foco de uso político e centro de escândalos como os que envolveram o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a Caixa Econômica Federal tem tentado melhorar sua gestão, com definição de regras de administração de fundos, fechamento de agências e redução de quadro de pessoal. A tarefa não é fácil: o grupo Caixa detém ativos que totalizam R$ 1,2 bilhão, 27% dos bens e recursos somados de todas as empresas estatais no país, o segundo maior entre as estatais do país, na frente de gigantes como Petrobras, BNDES e Eletrobras.

O banco passou por problemas para se adequar às regras internacionais de solvência de bancos e foi alvo de operações de investigação, que o obrigaram a passar por uma moralização em sua gestão, adotando padrões de governança. Mesmo assim, escorregadas ainda acontecem, como a realização de um megaevento para 6 mil funcionários nesta quarta-feira (16), no estádio Mané Garrincha, em Brasília.

A recuperação do resultado financeiro da Caixa entre 2016 e 2017 reflete isso. O lucro líquido do grupo Caixa (que inclui o braço de seguros da empresa) cresceu 202%, passando de R$ 4,1 bilhões para R$ 12,5 bilhões. Para alcançar isso, uma das medidas foi a alteração na política de plano de saúde para os mais de 87 mil funcionários e seus dependentes. Foi estipulado um teto nos gastos do banco com benefícios de assistência à saúde e definição de contrapartida por parte dos funcionários, o que causou protestos e polêmicas entre os representantes dos funcionários. Com a mudança, o banco reduziu sua projeção de gastos atuariais em R$ 5,3 bilhões.

A demissão de funcionários em planos voluntários também está no rol de medidas de corte de custo da entidade. O banco chegou a ter 100,6 mil funcionários em 2014. Em 2017, eram 87.654 (queda de 7,71% ante 2016). Nos cortes de cargos e PDVs, foram reduzidos 7.324 pessoas, o segundo maior corte entre as estatais e quase o dobro do que a Petrobras ou o Banco do Brasil conseguiram reduzir de seu quadro de funcionários.

Novas regras de governança corporativa foram implantadas, o que colocou o banco no Nível 1 do Índice de Governança da Secretaria de Empresas Estatais do Ministério do Planejamento. A melhora do índice da Caixa foi de 70% entre a medição feita em 2017 e a nova avaliação, divulgada na semana passada. A nota de governança da estatal passou de 7,64 para 9,69.

Para 2018, o banco quer reduzir seus custos em R$ 2,6 bilhões, boa parte disso com o fechamento de cem agências, segundo reportagem do Estado de S.Paulo.

Para isso, terá de vencer resistências entre entidades de funcionários e também pressões políticas internas e externas. A presidência da Caixa é feudo do PP, partido que esteve no centro de escândalos como o revelado pela Operação Lava Jato.

Com grande capilaridade perante a população, administrando programas como o Bolsa Família, e uma carteira de crédito de R$ 706 bilhões em 2017, o banco concentra grande influência política.

Plano de pensão de R$ 60 bilhões não tem transparência e acumula déficit
A modernização da gestão do Fundo de Previdência dos funcionários da Caixa, a Funcef, ainda é um ponto que precisa ser abordado. Com uma carteira de R$ 60 bilhões, é o segundo maior fundo complementar de grupos estatais, atrás apenas do Previ (Banco do Brasil).

Mas há sérios problemas na gestão desse fundo, utilizado politicamente nas gestões do PT para fomentar a expansão de obras de infraestrutura. O déficit acumulado do fundo soma R$ 12,9 bilhões e já foram feitas três chamadas para que os participantes do Funcef depositem recursos para cobrir parte do buraco. Este mês ocorreu o terceiro equacionamento, com os participantes pagando 20% de contribuição extraordinária.

Fabiana Matheus, diretora de Previdência e Saúde da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae), explica que há pouca informação por parte dos gestores do fundo sobre a política de investimentos. Outro problema descrito pela Fenae é a falta de gestão diferenciada entre os perfis de participantes, o que acarreta em perdas no rendimento ou risco acima do necessário.

Questões sobre a política de investimentos do fundo são escassas segundo a entidade que representa os participantes. A Funcef não publica as informações em seus canais e há questionamentos sobre alguns dos investimentos, que estão sem resposta. Segundo Fabiana, há informações de que a entidade quer reduzir seu investimento na usina hidrelétrica de Belo Monte, mas faltam comunicações da administração do fundo para seus participantes.

“Fomos pegos de surpresa na semana passada, quando o Funcef começou a discutir mudanças no seu estatuto, vigente desde 2007. Pedimos para criar um grupo de trabalho e a Funcef vai apresentar a proposta para nós, mas é completa a falta de transparência e exclusão do participante do debate”, afirmou Fabiana.

A entidade também afirma que a Caixa tem repassado a conta de passivos trabalhistas para a Funcef, aumentando o déficit. O rombo é de R$ 1,5 bilhão, que não está provisionado para essas causas. “Não existe ação da Funcef para cobrar a Caixa, ela não está pagando nada e está confortável, pois terceirizou a conta para nós, participantes do fundo. Esse é um grande problema que dificulta a Funcef a reverter seus déficits”, afirmou.


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